quinta-feira, 28 de julho de 2016

Dr. Craig responde sobre a inerrância bíblica

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Pergunta:

Sempre escuto com prazer você falar, e, sobretudo, amo as partes do interrogatório e das perguntas e respostas de seus debates. Foi um prazer conhecê-lo na conferência em Atlanta.

Minha pergunta está relacionada com a natureza da inspiração da Escritura. Crentes debatem sobre a diferença entre inspiração e inerrância e muitas vezes discutem sobre a definição do que significa ser inerrante (discussão que, a meu ver, conduz às vezes à má exegese e hermenêutica visto que são forçados a enquadrarem uma interpretação que, na verdade, não é razoável, em virtude de uma visão de inerrância que Deus pode não ter pretendido).

Como ateu, cheguei à fé principalmente ao ler a Bíblia por um ano. Uma vez que a segunda seção do livro que estou escrevendo é sobre a inspiração da Escritura, tenho dedicado muito tempo pensando em como convencer os incrédulos. Em meu estudo, um pensamento estranho me sobreveio. Não importa se o Novo Testamento é inerrante ou mesmo inspirado – só o que importa é se ele é verdadeiro.

Se os escritores dos evangelhos registraram de forma precisa o que Jesus disse e fez, e se Lucas preservou a história desde cerca do ano 30 ao 62 AD, e se os autores das epístolas escreveram sobre o que aprenderam com Jesus e os apóstolos, então, temos tudo que precisamos para nos tornarmos cristãos e termos um relacionamento com Deus.

Pessoas se tornaram discípulas de Jesus por mais de duas décadas antes do Novo Testamento começar a ser escrito! Não me entenda mal – eu acredito que o NT seja inspirado, como 2ª Timóteo 3 e 1 Pedro indicam (embora ambos se refiram ao Antigo Testamento. 2ª Pedro 3:16 se refere às cartas de Paulo como Escritura, e Paulo cita ou parafraseia o evangelho de Lucas em mais de uma ocasião). 

Entretanto, tenho percebido que muitos apologistas especializados (incluindo você mesmo), não argumentam a favor da inspiração da Escritura em debates, mas sim pela sua precisão histórica.

Minha pergunta é: nós realmente precisamos argumentar com base na inspiração e na inerrância? Não seria melhor argumentarmos que as Escrituras são confiáveis? Assim fazendo, silenciamos aqueles (como Bart Ehrman ou Shabir Ally) que se valem das discrepâncias entre os relatos para fugirem do ponto central (muitas das quais são fáceis de explicar, de qualquer modo). Obrigado por escolher minha pergunta e por ajudar tantas pessoas.

Joe,
Estados Unidos.


Dr. Craig responde:

Ao lidar com sua pergunta, Joe, é importante que façamos a distinção entre as diferentes tarefas da apologética e da teologia. A tarefa da apologética é apresentar uma justificação racional para a verdade da cosmovisão cristã. Por "Cosmovisão Cristã", não me refiro ao conjunto completo das doutrinas cristãs.  Refiro-me aos elementos gerais de uma visão que a tornaria digna de ter aposto a si o rótulo de "cristã". De maneira mais simples, trata-se do que é necessário e suficiente acreditar a fim de se tornar um cristão. Este tipo de compreensão minimalista da visão de mundo cristã é o que C. S. Lewis chamou de "Cristianismo Puro e Simples".

As colunas centrais da cosmovisão cristã me parecem ser a existência de Deus e Sua decisiva autorevelação em Jesus, demonstrada na Sua ressurreição dos mortos. Se alguém passa a crer nesses dois pontos, então, esse alguém deve se tornar um cristão, e o resto é questão de trabalhar os detalhes.

Agora, como você percebe, para que se forneça uma justificação para essas duas crenças, não precisamos afirmar a inspiração bíblica, e muito menos a inerrância. Os argumentos da teologia natural para a existência de Deus não dependem da inerrância bíblica, nem tampouco da demonstração dos fatos cruciais da vida de Jesus de Nazaré, incluindo Sua alegações radicais, nas quais se colocava no lugar de Deus, e os eventos chave que fundamentam a inferência de Sua ressurreição dos mortos.

Apologistas cristãos populares já há um tempo defendem, da boca pra fora, este ponto da inerrância, mas não o levaram a sério, como se revela ao utilizarem-se de harmonizações implausíveis a fim de defenderem os relatos dos evangelhos contra qualquer alegação de erro. Tais medidas são desnecessárias. A verdade é que hoje os fatos centrais que apoiam a inferência da ressurreição de Jesus são admitidos pela ampla maioria dos eruditos do Novo Testamento, até mesmo por aqueles que entendem que os evangelhos estão cheios de erros e inconsistências.

Por exemplo, Wolfhart Pannenberg, meu orientador no doutorado, argumentava em favor da historicidade da ressurreição de Jesus e do túmulo vazio, embora acreditasse que as histórias sobre o túmulo vazio são tão lendárias que elas não possuem "sequer um núcleo de verdade histórica". Eu penso que Pannenberg subestimou seriamente a credibilidade histórica dos relatos do túmulo vazio, principalmente em virtude do trabalho do crítico alemão Hans Grass; mas, deixando isso de lado: o fato é que Pannenberg ilustra bem como alguém pode ter uma crença na ressurreição corporal de Jesus que seja historicamente justificada, sem estar comprometido com a inerrância dos textos.

Então, eu quase nunca argumento com um incrédulo em torno da inerrância bíblica. Estou disposto a consentir, como ponto de partida para a discussão, com todos os erros e inconsistências do Antigo e Novo Testamentos que ele quiser levantar, enquanto que eu insisto que os documentos reunidos para o que depois foi chamado de Novo Testamento são fundamentalmente confiáveis no que tange aos fatos centrais que embasam as alegações e o destino de Jesus de Nazaré. Para a tarefa da apologética, de fato, não importa se Jesus nasceu em Belém, qual dia da semana ele foi crucificado, quantos anjos estavam na tumba e assim por diante. Contanto que os fatos centrais estejam assegurados, o incrédulo deve se tornar um cristão.

No que se refere à missão da teologia, as coisas são diferentes. O dever da teologia é apresentar sistematicamente as verdades ensinadas nas Escrituras. Deste modo, procura-se desenvolver um sistema coerente de doutrina que seja fiel à Escritura. Baseado no que se julga ser o melhor sentido da Escritura, desenvolve-se um conjunto mais detalhado da doutrina cristã. Isso incluirá doutrinas acerca do que a Escritura tem a dizer sobre ela mesma.

Lewis reconheceu que ninguém deveria ficar com o "Cristianismo Puro e Simples" meramente. O "Cristianismo Puro e Simples", ele disse, é como um salão de entrada que leva para vários aposentos. Ninguém se contenta em permanecer no salão de entrada; são nos aposentos onde se encontram as lareiras, os sofás e as conversas. Então, depois de passar pelo salão de entrada, a pessoa se encaminhará para os aposentos nos quais encontrará cristãos protestantes, católicos, ortodoxos e coptas. Por fim, ela vai encontrar uma sala onde se sinta mais confortável com as doutrinas que estão ali estabelecidas.

Assim, em meu curso "Defensores", que estuda a doutrina cristã, o primeiro assunto que consideramos é a Doutrina da Revelação, ou seja, como Deus se revelou, a qual abrange doutrinas sobre a inspiração e a inerrância da Escritura. A crença de que a Escritura não é simplesmente um ensinamento humano mas a própria Palavra de Deus para nós será importante no viver a vida cristã. Ela também fornecerá um guia autoritativo para desenvolver o restante da doutrina de Cristo.

Portanto, em resposta às suas perguntas, nós não precisamos "argumentar com base na inspiração e na inerrância" frente aos incrédulos; contudo, precisamos estudar essas questões com nossos companheiros cristãos. Lidando com incrédulos, devemos simplesmente defender que os documentos que formam o Novo Testamento são confiáveis o bastante para assegurar as crenças de que Jesus via a si próprio como o Messias, o único Filho de Deus, e como o Filho do Homem mencionado em Daniel; que Sua crucificação, sepultamento, o túmulo vazio, Suas aparições pós-morte, e a origem da crença dos primeiros discípulos em Sua ressurreição são historicamente bem fundamentados. Ao nos dirigir a crentes cristãos, temos de examinar a natureza da inspiração bíblica e o que dela decorre para a veracidade da Escritura. 

Tradução: Reginaldo Castro.


        

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