quarta-feira, 1 de abril de 2015

A ciência "matou" Deus?


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O trecho abaixo é extraído de meu livro: "Deus é um Delírio?"
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Em 1882, o famoso filósofo ateu Friedrich Nietzsche declarou: “Deus está morto”[1]. Mais de um século se passou desde então, e podemos dizer seguramente que a fé em Deus não apenas não morreu, mas está mais viva do que nunca. Ainda que tenham sido muitos os ateus que tenham decretado a morte de Deus com o avanço da ciência nos últimos séculos, eles tiveram que engolir o fato de que a crença em Deus não apenas continua existindo no mundo, mas ainda segue sendo esmagadora maioria entre os mais de sete bilhões de seres humanos no planeta.

Em “O Delírio de Dawkins”, Alister McGrath faz importantes observações sobre como haviam decretado a morte de Deus no século passado, e o que de fato aconteceu:

“Por mais de um século, notáveis sociólogos, antropólogos e psicólogos declararam que seus filhos veriam o despertar de uma nova era, em que esse ‘delírio’ seria deixado para trás definitivamente. Nos anos 1960, diziam que a religião estava desaparecendo, substituída por um mundo secular (...) Duas mudanças ocorreram desde então. Em primeiro lugar, a religião fez uma reviravolta. Ela é um elemento tão significativo no mundo de hoje que parece estranho pensar que, há apenas uma geração, sua morte tenha sido prevista com tanta confiança. O escritor humanista Michael Shermer, talvez mais bem conhecido como diretor da Skeptics Society e editor da revista Skeptic, retomou com ímpeto esse ponto em 2000 ao afirmar que nunca a população norte-americana acreditara tanto, e em tão grande proporção, em Deus. Ele não apenas não está ‘morto’ – conforme o filósofo alemão Nietzsche proclamou precipitadamente –, como nunca pareceu estar mais vivo”[2]

Há quem diga que o próprio Dawkins afirmou, há tempos atrás, que a religião é uma doença que desapareceria até o final da sua vida. Hoje ele já tem 73 anos e somente alguém que literalmente estivesse delirando reafirmaria tal coisa. A religião tem se demonstrado indestrutível diante do avanço científico, porque nada no avanço científico atesta algo contra a religião.

Em seu livro, Dawkins tenta rever tal conceito apelando para certas pesquisas que mostram que o número de cientistas ateus é bem maior que o de cientistas crentes. Essa técnica é uma forma de manipulação muito comum em apresentação de dados, e bastante presente em campanhas políticas, onde os candidatos possuem vários dados diferentes, em diferentes áreas, por diferentes pesquisas e em diferentes lugares, e elegem arbitrariamente os dados que mais lhe favorecem para exibi-los ao público, que tristemente acaba comprando a ideia e acreditando que determinado político é mesmo excelente!

Dawkins faz a mesma coisa, mas contra a religião. Existem dezenas de pesquisas sobre a quantidade de cientistas teístas e ateístas, feitas por diferentes instituições, em diferentes épocas, em diferentes lugares, para grupos diferentes e algumas até encomendadas, mas Dawkins arbitrariamente seleciona três ou quatro que mais favorecem a sua visão ateísta, e em cima delas festeja gloriosamente o “triunfo” de seu ateísmo, como se fosse a única visão cientificamente plausível. Um charlatanismo tão grosseiro que é de se impressionar que existam pessoas que comprem tal discurso como se fosse sério.

Para entendermos melhor a forma de manipulação que Dawkins usa, basta compreender que existe um abismo muito grande entre “teísmo” e “ateísmo”, e ainda maior entre “cristão” e “ateu”. Em uma pesquisa hipotética que apresente 30% dos cientistas como teístas, Dawkins é rápido em “concluir” que os outros 70% são descrentes, quando, na verdade, a descrença em um teísmo não configura necessariamente a descrença absoluta em um Deus. Em outras palavras, Dawkins puxa para o seu lado um enorme quantitativo numérico que jamais compactuaria com suas ideias neo-ateístas.

Há um enorme abismo entre o teísmo e o ateísmo. Existem os deístas (que creem na existência de um Deus impessoal), os agnósticos (que não sabem ao certo se Deus existe ou não, mas que abrem esta possibilidade), os pandeístas (que creem que Deus criou a natureza e depois se uniu a ela) e os panteístas (que creem que Deus é a natureza, mas em geral acreditam em vida após a morte e em outras coisas que os ateus não admitem). Mesmo do grupo de ateus do outro lado, apenas uma minoria de cientistas é neo-ateísta, sendo que a maioria de cientistas ateus adota o ateísmo tradicional de Gould e muitos outros, que não veem qualquer conflito entre a ciência e a religião.

Eu até arriscaria dizer que, em se tratando de cientistas, a maioria dos outros 70% é de agnósticos, a segunda parte de deístas e uma minoria de ateus, e menos ainda de neo-ateus. Mas Dawkins desconsidera tudo isso em suas estatísticas, pois nenhuma vez trabalhou com uma pesquisa que informasse precisamente o número de deístas e agnósticos, caindo em um falso dualismo de crente/descrente, teísta/ateísta. Não surpreenderia em nada se a esmagadora maioria dos cientistas repudiasse Dawkins em sua posição de que a ciência anula qualquer fé, já que cientistas ateus são minoria e neo-ateus menos ainda!

Dawkins faz parecer que o renomado cientista ateu Stephen Gould mentia ao dizer que metade de seus colegas cientistas eram religiosos[3], enquanto ele nos quer passar a ideia de que este tipo de cientista quase não existe. Uma pesquisa mais séria a este respeito, feita em escala global no ano de 1916, mostrou que 40% dos cientistas criam em um Deus pessoal que intervém na natureza e realiza milagres. A mesma pesquisa foi repetida 81 anos depois, e Alister McGrath nos conta a gigantesca e impressionante diferença constatada de lá pra cá:

“Em 1916, cientistas diligentes foram inquiridos sobre se acreditavam em Deus, especificamente num Deus que se comunica de modo zeloso com a humanidade e a quem se possa orar ‘na expectativa de receber uma resposta’. Os deístas não acreditam num Deus segundo essa definição. Os resultados ficaram famosos: grosso modo, 40% acreditavam nesse tipo de Deus, 40% não e 20% não tinham certeza. Valendo-se dessa mesma pergunta, a pesquisa foi repetida em 1997 e resultou quase exatamente no mesmo padrão, com um leve aumento dos que não acreditavam (chegando a 45%). O número dos que acreditavam em Deus permaneceu estável, em torno de 40%”[4]

Impressionante, não é mesmo? Com todo o avanço científico abrangendo o período de quase um século, houve uma surpreendente queda no número de cientistas teístas: eram 40% em 1916, e 40% em 1997. Isso não é fascinante? Os neo-ateus deveriam mostrar isso ao mundo como uma prova incontestável de que a ciência matou Deus. Onde estão os cientistas teístas agora?

Os dados mostram um aumento ínfimo e insignificante no número de descrentes (eram 40% e agora são 45%), mas estes 5% adicionais não vieram da parte dos que criam em Deus, mas dos indecisos. Os que creram eram 40% e manteve-se igual no final do século passado. Isso sem mencionar que a pesquisa foi bem específica, mencionando um tipo de Deus teísta intervencionista, capaz de ouvir e atender uma oração. Se fosse de uma forma mais abrangente que incluísse os deístas e parte de panteístas, é lógico que a porcentagem de “crentes” seria bem maior. Incluindo deístas, panteístas e agnósticos, a porcentagem de descrentes absolutos (ateus) seria vergonhosa. Perderia até para os “indecisos”.

Por fim, a falha capital que permeia todo o pensamento de Dawkins é pensar que todos os cientistas que são ateus, são ateus por causa da sua ciência, e não por outras razões. Dizer que todos os cientistas ateus são ateus por causa da ciência é tão falacioso quanto afirmar que todos os jardineiros ateus são ateus por causa da jardinagem. Dawkins quer ver uma lógica de causa e efeito onde não existe. Mais uma vez McGrath discorre muito bem a este respeito, dizendo: 

“A maior parte dos cientistas descrentes que conheço são ateus por motivos outros que não sua ciência: eles trazem essas suposições para sua ciência, em vez de embasá-las em sua ciência. Na verdade, se minhas conversas pessoais com os cientistas tiverem alguma validade, vários dos mais ruidosos críticos de Dawkins, entre seus pares, são na verdade ateus. Sua insistência petulante, dogmática, de que todos os ‘verdadeiros’ cientistas devem ser ateus tem encontrado feroz resistência precisamente na comunidade que ele acreditava ser sua mais ardente e leal defensora”[5]

Há diversos motivos que podem levar alguém a ser ateu. Pode ser que ele tenha nascido em família atéia, pode ser que ele tenha se decepcionado com alguma igreja ou pastor, pode ser que ele não tenha visto evidências suficientes ou que tenha alguma grande inquietação por causa de alguma dúvida em relação à fé (ex: o problema do mal), mas são poucos os cientistas ateus que se tornaram ateus por causa da sua ciência. Dawkins não tem nenhuma evidência, nenhum dado, nenhuma estatística que prove que os cientistas ateus se tornaram ateus por causa da ciência. Ele simplesmente sustenta isso a priori, eliminando automaticamente todas as amplas outras possibilidades existentes.

Há uma quantidade significativa de cientistas ateus que creem que a ciência não é incompatível com a fé, e que tem seu ateísmo relacionado a outros diversos fatores que podem tornar uma pessoa atéia – seja ela cientista ou não –, incluindo a herança familiar. Portanto, a não ser que Dawkins queira reduzir seu argumento a uma forma que beire o ridículo (ex: “os ateus são mais inteligentes porque existem vários ateus que são cientistas”), seu argumento neste ponto é totalmente inútil, tanto quanto o resto do livro.

A verdade é que os neo-ateus, por falta de argumentos reais, querem “sequestrar” a ciência, tomando-a para o lado deles do ringue, como se eles fossem os “detentores” da ciência e como se eles monopolizassem o conhecimento científico. Eles se vêem arrogantemente como os “porta-vozes” da ciência, mais ou menos aquilo que o papa é para o catolicismo. Este “sequestro” da ciência é intelectualmente criminoso, tanto quanto um sequestro real. Foram cientistas cristãos que levaram a ciência ao patamar em que se encontra hoje, e até hoje muitos cristãos e portadores de outra fé em Deus continuam desenvolvendo o conhecimento científico e o levando a dimensões maiores – a ideia patética de que apenas os ateus estão “do lado da ciência” não passa de uma fantasia neo-ateísta, criada para iludir os incautos.

Por Cristo e por Seu Reino,
Lucas Banzoli (apologiacrista.com)


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[1] A Gaia Ciência.
[2] Alister McGrath, O Delírio de Dawkins.
[3] Stephen Jay Gould, Impeaching a Self-Appointed Judge.
[4] Alister McGrath, O Delírio de Dawkins.
[5] ibid

1 comentários:

  1. Não é novidade que o objetivo do ateísmo militante é ir a todo custo contra a religião.....

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