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O trecho abaixo é extraído de meu livro: "O Problema do Mal"
O trecho abaixo é extraído de meu livro: "O Problema do Mal"
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Outra razão pela qual Deus não intervém o tempo todo
destruindo o livre-arbítrio humano é porque ele deu ao homem a autoridade sobre
a terra. Este é um conceito muito claro biblicamente, e ao mesmo tempo difícil
de explicar sem correr o risco de pender para a heresia.
Quando Deus
colocou o homem na terra, ele o colocou como autoridade sobre toda a criação:
“Então disse Deus: ‘Façamos o homem à nossa
imagem, conforme a nossa semelhança. Domine ele sobre os peixes do mar, sobre
as aves do céu, sobre os animais grandes de toda a terra e sobre todos os
pequenos animais que se movem rente ao chão’. Criou Deus o homem à sua imagem,
à imagem de Deus o criou; homem e mulher os criou. Deus os abençoou, e lhes
disse: ‘Sejam férteis e multipliquem-se! Encham e subjuguem a terra! Dominem
sobre os peixes do mar, sobre as aves do céu e sobre todos os animais que se
movem pela terra’”
(Gênesis 1:26-28)
Deus colocou o
homem no jardim “para cuidar dele e cultivá-lo”
(Gn.2:15). Os salmistas compreenderam bem esta verdade. Davi disse que “os mais altos céus pertencem ao Senhor, mas a terra ele
a confiou ao homem” (Sl.115:16). Ele também sublinhou o fato de que Deus
fez o homem autoridade sobre a terra, para dominar sobre todas as obras das
mãos de Deus:
“Quando contemplo os teus céus, obra dos teus
dedos, a lua e as estrelas que ali firmaste, pergunto: Que é o homem, para que
com ele te importes? E o filho do homem, para que com ele te preocupes? Tu o
fizeste um pouco menor do que os seres celestiais e o coroaste de glória e de
honra. Tu o fizeste dominar sobre as obras das tuas mãos; sob os seus pés tudo
puseste: Todos os rebanhos e manadas, e até os animais selvagens, as aves do
céu, os peixes do mar e tudo o que percorre as veredas dos mares” (Salmos 8:3-8)
Isso
obviamente não significa que “Deus abriu mão de sua soberania”, mas significa
que Deus decidiu colocar o homem como autoridade sobre a criação. O homem é o
“mordomo” de Deus na terra, o administrador da criação do Pai. Ele não é uma
marionete, nem um autômato, nem um escravo. Ele é a autoridade sobre a terra. Isso significa, como bem destacou Dutch
Sheets, que se o destino da humanidade desse certo seria por causa do homem, e
se desse errado seria por culpa do homem.
A autoridade
está nas mãos da humanidade, razão pela qual até mesmo quando Deus intervém na
terra é por meio da oração daquele que tem autoridade sobre ela, ou seja, nós
mesmos. É por isso que em certa ocasião Deus disse:
“Procurei entre eles um homem que erguesse o
muro e se pusesse na brecha diante de mim e em favor da terra, para que eu não
a destruísse, mas não encontrei nem um só. Por isso derramarei a minha ira
sobre eles e os consumirei com o meu grande furor; sofrerão as consequências de
tudo o que eles fizeram, palavra do Soberano Senhor” (Ezequiel 22:30-31)
Israel havia
pecado gravemente contra Deus. O povo da terra praticava “roubos e extorsão; oprime os pobres e os necessitados e maltrata
os estrangeiros, negando-lhes justiça” (Ez.22:29). Mesmo assim, Deus
estava disposto dar-lhes uma nova chance. Para isso bastaria que alguém se
colocasse “na brecha”, rogando a Ele pela sobrevivência de Israel. No entanto,
Deus não encontrou ninguém. Todos haviam caído no pecado ou na negligência, e
então a punição veio. Este conceito pode parecer forte demais para muitos, mas
a verdade é que Deus permite que os homens tomem decisões que podem influenciar
a história. O homem é senhor do seu destino, a autoridade responsável pelo
êxito ou pelo fracasso deste mundo, e isso explica o porquê que tantos males
ocorrem.
É por isso que
os cristãos oram para que não seja feita a nossa
vontade, mas sim a de Deus. Ao pedirmos isso, estamos dizendo a Deus que
abrimos mão do nosso direito legal de guiar nossas próprias vidas, e colocando
a Cristo no comando do barco. Mas essa oração só faz sentido se aqueles que não pedem por isso não recebem; ou seja,
se as pessoas do mundo continuam guiando suas próprias vidas – o que explica o
porquê que tanta gente se perde, mesmo com Deus desejando a salvação de todas
as pessoas (2Pe.3:9; 1Tm.2:3-4).
É claro que
Deus não é completamente passivo e nem perde o controle das coisas. Ele
intervém em respostas às orações e periodicamente impede que o mundo caminhe
para a autodestruição. Ele não faz isso porque precisa fazer, mas faz por misericórdia. Se ele não interviesse
nunca, a responsabilidade permaneceria do homem. Deus intervém porque sabe que
o homem se destruiria mutuamente sem sua intervenção.
O mundo
estaria muito pior sem a intervenção periódica de Deus, refreando o pecado e
punindo os culpados. No mundo pré-diluviano, por exemplo, a calamidade moral
havia chegado a tal ponto em que só sobravam Noé e sua família dentre os justos
do mundo antigo. E, se Deus não interviesse, provavelmente em pouco tempo não
sobraria ninguém, bastando que Noé e sua família morressem ou fossem
assassinados pela multidão de ímpios. “O Senhor viu
que a perversidade do homem tinha aumentado na terra e que toda a inclinação
dos pensamentos do seu coração era sempre e somente para o mal” (Gn.6:5).
Deus teve que
intervir, pelo bem do homem. Se não fosse por isso, a humanidade já teria se
autodestruído. O ateu não aceita as intervenções de Deus, nem mesmo com o
próprio dilúvio. Se Deus mata todos os ímpios em um dilúvio, ele é do mal,
porque matou todos os ímpios. Mas se Deus deixa todos os ímpios viverem, ele é
do mal, porque deixou todos os ímpios vivos. Eles não chegam a um acordo. A
verdade é que Deus intervém, mas não sempre,
porque se interviesse sempre estaria tirando a autoridade do homem sobre a
terra e seu consequente livre-arbítrio. Ou o homem tem autoridade, ou ele não
tem.
Se Deus
impedisse todos os males de acontecer, ele teria dado autoridade ao homem de
mentirinha. Se só há liberdade para fazer o bem, então não há liberdade. A
“liberdade” seria uma enganação. Não haveria “escolha” real, se a opção “B” não
fosse concretizável. Se Deus manipula as decisões do homem a cada vez que ele
escolhe errado, então o homem não é autoridade. É necessário permitir o mal,
como decorrência da liberdade dada ao homem pelo desejo do próprio homem, que
escolheu comer do fruto do conhecimento do bem e do mal e ter total autonomia
em lugar de Deus.
Estes
conceitos não são fáceis de se explicar, primeiramente porque não há como o
homem determinar com que frequencia que Deus intervém, ou onde exatamente que
ele intervém. Um exemplo muito popular dado pelos ateus é o da queda de aviões.
Eles argumentam que, se Deus existe e deseja o bem, ele deveria impedir todos
os aviões de cair, contornando qualquer problema técnico ou do piloto. Já vimos
que este quadro é ilusório em um mundo onde o homem é a autoridade e decide por
si mesmo. Se Deus nunca deixasse um avião cair, nenhum piloto iria realmente se
preparar para pilotar um avião. Se colocasse metade do combustível necessário
para a viagem, a outra metade surgiria sozinha. Se o piloto estivesse bêbado ou
dormindo, o avião pousaria por si mesmo. Se colocassem fogo no avião, o fogo
apagaria do nada, e assim por diante.
A conclusão
óbvia você já deve ter notado. Dizer que Deus deveria impedir sempre os aviões de
cair implica necessariamente em uma completa desordem e caos no mundo natural.
O homem se resumiria a um autômato e não teria autoridade sobre nada. Suas
escolhas não poderiam determinar seu rumo. O livre-arbítrio não existiria. As
leis naturais seriam quebradas a cada instante. Esta simplesmente não é uma opção razoável!
O ateu poderia
então dizer que Deus não deveria impedir que todo avião caísse, mas deveria impedir que mais aviões caíssem do
que a quantidade de aviões que costuma cair no mundo. O problema com este
argumento é que simplesmente não é
possível afirmar com exatidão quantos aviões que Deus hipoteticamente
impede de cair no mundo, e este dado é imprescindível para o argumento ateísta,
pois ele presume que Deus não impede nada. Esse pressuposto, no entanto, não
tem como ser provado.
Considerando
os dados da Associação Internacional de Transporte Aéreo (Iata), em 2014 um
avião caiu para cada quatro milhões de
aviões que não caíram. Poderíamos conjecturar que este índice praticamente
insignificante de queda de aviões seria muito maior se Deus não interviesse
nunca, e só não é menor porque é necessário que Deus não intervenha sempre. Ou
seja, o ateu que argumenta que Deus nunca impede a queda de aviões não tem como
saber se ele impede ou não. Se Deus impede, nós nem ficaríamos sabendo. E se
ele permite que um a cada quatro milhões de aviões caiam, é porque a autoridade
do homem sobre a terra não pode ser completamente ignorada, pelas razões já
expostas aqui. Por fim, mesmo se um único avião tivesse caído na história, os ateus estariam usando essa queda para culpar Deus do mesmo jeito.
O mesmo raciocínio se
aplica a outro exemplo comum, o das balas perdidas. “Por que Deus não desviou a
bala?”, questiona o ateu. Mas se Deus costuma desviar balas, isso está além do conhecimento
aplicável. Uma bala que teoricamente acertaria uma pessoa e que fosse “desviada
por Deus” para acertar uma parede passaria totalmente imperceptível. Agiríamos
com naturalidade frente ao fato, não observando qualquer intervenção sobrenatural.
O problema é
que na mente de muitas pessoas Deus só intervém em situações extremas, como
quando um acidente mata dezenas e só um sobrevive “por milagre”. Eu não creio
que seja assim. Entendo que a esmagadora maioria das intervenções divinas são
muito mais sutis do que se pensa, de modo que não é possível determinar quando
Deus intervém e quando ele não intervém. Você pode ter recebido muitos livramentos
divinos dos quais jamais se deu conta, da mesma forma que pode ter achado que recebeu
um livramento quando apenas teve sorte. Essas são questões que estão além do conhecimento
humano.
Se Deus não
interviesse nunca, nós nem estaríamos
aqui. E mesmo quando Deus decide não intervir, pode ser por um propósito maior
(que já vimos anteriormente), ou para mostrar ao homem as consequencias de sua
própria rebeldia deliberada. O homem erra, e o homem paga a conta. A humanidade
é fruto das decisões certas e erradas do homem, somada a intervenções divinas
periódicas que impedem que ela se autodestrua completamente – sendo estas
intervenções quase sempre intimamente relacionadas com a oração de adoradores
sinceros a Deus (o que torna a oração profundamente importante).
Em um exemplo
análogo ao do avião, Bruce Reichenbach discorre sobre uma pessoa se afogando em
um lago – ocasião em que um ateu prontamente exigiria uma ação sobrenatural da
parte de Deus. Ele pondera:
Se Deus consistentemente
estivesse interrompendo as leis naturais, o mundo logo se tornaria um caos, no qual
a ação moral humana seria impossível. Sem a regularidade e a ordem, não
poderíamos planejar nem calcular racionalmente as ações que deveríamos
executar, a fim de atingir nossos objetivos. Seria impossível predizer os
resultados de nossas ações, e de outras pessoas. Suponhamos que estamos vendo
uma pessoa num lago, gritando por socorro. Devemos agir? Se sim, de que
maneira? Se não houvesse leis naturais, ou se tais leis fossem frequentemente violadas
pela intervenção divina (e direta) não saberíamos se deveríamos ou não pular na
água para tentar salvar a pessoa. Não saberíamos se a pessoa se afogaria ou não
naquele lago, se ela seria capaz ou não de erguer-se e caminhar por sobre as
águas, ou se ela flutuaria como uma rolha. Como deveríamos agir depende de como
podemos agir, e como podemos agir depende de nosso conhecimento. Neste caso,
depende de nosso conhecimento das propriedades naturais da água e como se
relacionam com o corpo humano. Contudo, sem este tipo de conhecimento, nossa
própria atividade moral se torna impossível. Embora isto não signifique que
Deus não pode agir diretamente sobre a natureza, certamente significa que Deus
não pode agir de maneira que redundaria na destruição da ordem natural e,
consequentemente, em nossa própria incapacidade para agir de modo racional,
prudente e moral.
Semelhantemente,
C. S. Lewis discorre:
Imagine uma viga de madeira que se torna suave como a grama
quando for usada como arma e o ar se recusasse a obedecer-me se eu tentasse
criar nele ondas sonoras que carregam mentiras ou insultos. Mas tal mundo seria
aquele em que ações erradas seriam impossíveis, e, portanto, o livre-arbítrio
seria nulo. Se esse princípio fosse levado à sua conclusão lógica, até mesmo os
maus pensamentos seriam impossíveis, e a matéria cerebral que usamos para
pensar iria se recusar a realizar a tarefa quando tentássemos enquadrá-los.
É por isso que as acusações
ateístas são geralmente tão simplistas e infantis, porque desconsideram as
consequencias de suas argumentações, ou a impossibilidade de seus pedidos se
concretizarem efetivamente em um mundo livre. Se Deus quisesse evitar todo o
sofrimento, ele poderia, mas neste caso a liberdade e a autonomia dos homens
acabariam juntamente com as leis naturais.
Na próxima vez que você
segurasse por engano um copo de água fervendo, a água congelaria sozinha. Na
próxima vez que você cruzasse a rua e estivesse prestes a ser atropelado, sua
perna seria puxada pra trás. Na próxima vez que você tentasse atirar em alguém,
a bala desviaria o alvo misteriosamente, e se estivesse próximo demais ela
nunca dispararia. Imagine tudo isso ocorrendo o tempo todo no mundo inteiro:
isso é pedir o fim do livre-arbítrio. Em mundo com liberdade, uma certa
quantidade de mal decorrente das escolhas humanas não é apenas admissível, mas
necessária. É a consequencia lógica de um mundo livre onde os homens podem ter
o “conhecimento do bem e do mal”, por ele mesmo requerido.
Paz a todos vocês que estão em Cristo.
Lucas, o Willian Lane Craig só debate com Ateus ou ele já debateu com apologistas católicos ?
ResponderExcluirEle é só com ateus. E já vi debatendo uma vez com um muçulmano também, mas 99% das vezes é sempre com ateus.
ExcluirOlá! Acho que você não entendeu o conceito mais básico do problema do mal -- na verdade, do sofrimento inútil: a contradição com a personalidade atribuída à divindade cristã. Em tese, o deus cristão ama as pessoas (há divergência sobre quantas, mas prossigamos) e deseja um relacionamento com elas.
ResponderExcluirAgora, imagine a seguinte situação: eu vejo uma criança sendo (ou prestes a ser) violentada sem chance de defesa. A única coisa moral a ser feita é tentar impedir esta violência injustificável, mesmo que haja prejuízo à minha integridade. Se eu nada fizesse, seria considerado imoral ou até mesmo cúmplice. Mas você acredita que seu deus está presente e nada faz, e isto não mancha sua bondade ou misericórdia, ou amor.
Não é só uma questão de livre escolha: o agressor também está violando a livre escolha da vítima, e para ajudar eu tenho que violar a livre escolha do agressor. Conceder o livre arbítrio sem estabelecer limites a ele é condenar uma sociedade à autodestruição. É uma questão de como mostrar o que é bom e ruim através de consequências e não de ameaças vãs.
Talvez pareça simplista, mas uma análise mais criteriosa teria que começar com os alicerces da fé cristã e levaria anos para terminar.
Quais sao as regras de deus para q sejamos fiel
ResponderExcluirTudo o que está na Sagrada Escritura.
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